quarta-feira, 26 de março de 2014

LER/DORT – RECONHECIMENTO COMO MOLÉSTIA PROFISSIONAL

LER/DORT – RECONHECIMENTO COMO MOLÉSTIA PROFISSIONAL

          
                                                                  * LEANDRO JORGE DE OLIVEIRA LINO

Uma das situações previstas na Lei n.º 7.713/1988, como isentiva do imposto de renda pessoa física para o aposentado, é ser portador de moléstia profissional, ainda que, não tenha sido aposentado por invalidez.

Diante de tal situação, o presente artigo visa abordar de forma genérica, o conceito de Moléstia Profissional e, analisar ser o DORT - distúrbio osteomuscular relacionado ao trabalho é considerado moléstia profissional e, portanto, seu portador sendo aposentado possui direito a isenção do IRPF sobre a integralidade dos proventos de aposentadoria recebidos, independente que quem seja a fonte pagadora.

DA DIFERENÇA ENTRE A LER  E O DORT

Inicialmente temos que diferençar a Lesão por esforços repetitivos (LER), em sentido genérico, da LER/DORT, que é uma verdadeira moléstia profissional.

Define-se LER em sentido genérico como sendo: Lesão por Esforço Repetitivo ou LER (em inglês Repetitive Strain Injury) são lesões nos sistemas músculo-esquelético e nervoso causadas por tarefas repetitivas, esforços vigorosos, vibrações, compressão mecânica (pressionando contra superfícies duras) ou posições desagradáveis por longos períodos.

Genericamente a LER, não obrigatoriamente relaciona-se a moléstia profissional, no entanto, poderá ter relação com o trabalho, sendo considerada moléstia profissional e, se adotando o termo LER/DORT.

A LER/DORT, por sua vez, é definida pelo Protocolo de atenção integral à Saúde do Trabalhador de Complexidade Diferenciada do Ministério da Saúde, como sendo, sendo sinônimo da LER, no entanto, decorrente diretamente da relação laboral.

Neste passo é interessante ver os termos do Protocolo:

“Para efeito deste protocolo, são considerados sinônimos lesões por esforços repetitivos (LER), distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (Dort), síndrome cervicobraquial ocupacional, afecções músculo-esqueléticas relacionadas ao trabalho (Amert), lesões por traumas cumulativos (LTC). As denominações oficiais do Ministério da Saúde e da Previdência Social são LER e Dort, assim grafadas: LER/Dort.”

“As Lesões por Esforços Repetitivos (LER) e Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (Dort) são por definição um fenômeno relacionado ao trabalho (KUORINKA e FORCIER 1005). São danos decorrentes da utilização excessiva, imposta ao sistema músculo-esquelético, e da falta de tempo para recuperação.”

“Caracterizam-se pela ocorrência de vários sintomas concomitantes ou não, de aparecimento insidioso, geralmente nos membros superiores, tais como dor, parestesia, sensação de peso e fadiga. Abrangem quadros clínicos do sistema músculo-esquelético adquiridos pelo trabalhador submetido a determinadas condições de trabalho.”

“Entidades neuro-ortopédicas definidas como tenossinovites, sinovites, compressões de nervos periféricos podem ser identificadas ou não. É comum a ocorrência de mais de uma dessas entidades nosológicas e a concomitância com quadros inespecíficos, como a síndrome miofascial. Freqüentemente são causas de incapacidade laboral temporária ou permanente.”




DA LER/DORT COMO MOLÉSTIA PROFISSIONAL

A lei n.º 8213/1991, em seu artigo 20, “caput”, inciso I, considera como doença profissional assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social.

O artigo 21-A, da Lei n.º 8.213/1991, incluído pela Lei nº 11.430, de 2006, estabelece que a perícia do INSS, analisará a ocorrência de acidente de trabalho, no sentido lato, incluindo aqui a doença profissional, ao constatar ocorrência de nexo técnico epidemiológico entre o trabalho e o agravo, decorrente da relação entre a atividade da empresa e a entidade mórbida motivadora da incapacidade elencada na Classificação Internacional de Doenças - CID, em conformidade com o que dispuser o regulamento.

Ao se constatar via perícia oficial do INSS, a ocorrência de acidente de trabalho, ou doença do trabalho, em situações as quais o segurado fique incapacitado para seu trabalho, por mais de 15 (quinze) dias, assim como, o nexo técnico epidemiológico, será concedido o auxílio-doença acidentário, nos termos do artigo 59 e ss., da Lei n.º 8.213/1991.

Por sua vez o auxílio-acidente, nos termos do artigo 86, da Lei n.º 8.213/1991, com a redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997, prevê a sua concessão após o término do auxílio-doença, quando houver a consolidação definitiva das lesões que geram àquele, reduzindo a capacidade laboral do segurado devido às sequelas existentes.

Portanto, temos aqui duas situações, sucessivas e interligadas, o auxílio-doença acidentário e o auxílio-acidente, sendo que, em ambos os casos, necessário a perícia médica oficial do INSS, e o nexo epidemiológico entre o trabalho e o agravo, uma vez comprovado o nexo, serão os benefícios concedidos, comprovando assim, a existência de doença profissional.

O Decreto n.º 3.048/1999, com a redação dada pelo Decreto nº 6.042, de 2007 em seu artigo 337, estabelece que p acidente do trabalho será caracterizado tecnicamente pela perícia médica do INSS, mediante a identificação do nexo entre o trabalho e o agravo; do acidente e lesão; a doença e o trabalho; e a causa mortis e o acidente.

Afirma ainda que em seu artigo 337, § 3.º, Lei n.º 3.048/1999, com a redação dada pelo Decreto nº 6.957, de 2009, o nexo entre o trabalho e o agravo, considera-se estabelecido, quando se verificar nexo técnico epidemiológico entre a atividade da empresa e a entidade mórbida motivadora da incapacidade, elencada na Classificação Internacional de Doenças - CID em conformidade com o disposto na Lista C do Anexo II.

Por força da Instrução Normativa do INSS/DC n.º 98, de 05/12/2003, que veio regulamentar a “atualização clínica das lesões por esforços repetitivos (LER) distúrbios osteomusculares relacionadas ao trabalho (DORT)”, considera-se como LER/DORT, entre outras moléstias Síndrome do Túnel do Carpo, Tenossinovite, Epicondilites.

A seção II, da Instrução Normativa do INSS/DC n.º 98, de 05/12/2003, que versa sobre a “Norma Técnica de Avaliação da Incapacidade Laborativa – Procedimentos Administrativos e Periciais LER/DORT”, em seu item 06, que versa sobre a conduta médico pericial, dispõe que constatada a incapacidade laborativa com nexo causal caracterizado, se deferirá o auxílio-doença acidentário (E-91).

Dessarte, seguindo o entendimento esposado pela IN INSS/DC N.º 98/2003, o setor pericial do INSS ao reconhecer o nexo técnico epidemiológico entre a doença profissional ou o acidente de trabalho, relacionado a LER/DORT, irá conceder o benefício do auxílio-doença acidentário, reconhecendo, portanto, juridicamente a existência da moléstia profissional.

NEXO TÉCNICO EPIDEMIOLÓGICO E O CNAE

Na lista C, do Decreto n.º 3.048/1999 (alterado pelo Decreto nº 6.957, de 9 de setembro de 2009 – DOU de 10/9/2009), são indicados intervalos de CID em que se reconhece Nexo Técnico Epidemiológico, na forma do §3º do art. 337, entre a entidade mórbida e as classes de CNAE indicadas, nelas incluídas todas as subclasses cujos quatro dígitos iniciais sejam comuns.

A LER/DORT é extremamente comum sua ocorrência nos Bancos Múltiplos, p.ex. Banespa/Santander, CEF, BB, Banco Itaú S/A, devido a grande sobrecarga de trabalho, exigência infinitas de metas e total falta de ergonomia do trabalho.

Para fins deste artigo iremos utilizar os Bancos Múltiplos, cujo CNAE é o de número 6422, cuja definição lá prevista refere-se: as atividades das instituições financeiras que concentram em uma única empresa atividades operacionais distintas, que são denominadas carteiras, estando autorizadas a receber depósitos à vista, em contas correntes. Estão sujeitas às mesmas normas legais e regulamentares aplicáveis às instituições singulares correspondentes às suas respectivas carteiras.

 Outro bom exemplo é a CEF – Caixa Econômica Federal, atualmente seguramente o maior banco múltiplo pública, que está enquadrado no CNAE n.º 6423.

Ambos os códigos de CNAE, se encontram relacionados a algumas das moléstias profissionais relacionadas a LER/DORT, cite-se como exemplo, a Síndrome do Manguito Rotador (CID M75.1), Tendinite Punho Direito (CID M75), Sinovite e tenossinovite (CID M65), Síndrome do túnel do carpo (CID G56), como comprovado a abaixo.

G50-G59
0155  1011  1012  1013  1062  1093  1095  1313  1351  1411  1412  1421  1529  1531  1532  1533  1539  1540  2063  2123  2211  2222  2223  2229  2349  2542  2593  2640  2710  2759  2944  2945  3240  3250  4711  5611  5612  5620  6110  6120  6130  6141  6142  6143  6190  6422  6423  8121  8122  8129  8610
M60-M79
0113  0155  0210  0220  1011  1012  1013  1020  1031  1033  1051  1052  1062  1064  1092  1093  1094  1095  1096  1099  1122  1311  1314  1321  1323  1340  1351  1352  1354  1359  1411  1412  1413  1414  1421  1510  1521  1529  1531  1532  1533  1540  1623  1732  1733  1742  1749  2040  2063  2091  2110  2121  2123  2211  2219  2221  2222  2223  2229  2312  2319  2342  2349  2439  2443  2449  2451  2531  2539  2541  2542  2543  2550  2591  2592  2593  2610  2631  2632  2640  2651  2710  2721  2722  2732  2733  2740  2751  2759  2813  2814  2815  2822  2823  2824  2840  2853  2854  2861  2864  2866  2869  2920  2930  2941  2942  2943  2944  2945  2949  3092  3101  3102  3104  3230  3240  3250  3291  3299  3316  3329  3701  3702  3811  3812  3821  3822  3839  3900  4221  4632  4634  4711  4713  4912  5111  5120  5212  5221  5222  5223  5229  5310  5320  5612  5620  6021  6022  6110  6120  6130  6141  6142  6143  6190  6209  6311  6399  6422  6423  6431  6550   7410  7490  7719  7733  8121  8122  8129  8211  8219  8220  8230  8291  8292  8299  8610  9420  9601

Note-se que as CID's do intervalo M60 A 79, possuem nexo técnico epidemiológico com a atividade 6422 (Banco Múltiplos) e 6423 (Caixa Econômica), portanto, presente o Nexo Técnico Epidemiológico, como no caso em análise onde restou correlacionadas acima a atividade e a CID.

DA CONCLUSÃO

De todo o exposto, conclui-se que a LER/DORT, para todos os fins legais é considerada uma moléstia profissional, sendo que, algumas atividades já se encontram claramente identificadas como facilitadoras da ocorrência desta moléstia profissional, devendo sempre haver o nexo causal entre a moléstia e a atividade profissional exercida, conhecido como nexo epidemiológico.

Uma vez ocorrido o nexo epidemiológico, existem fortes indícios da ocorrência da doença profissional, restando, ao empregado, comprovar este vínculo através de perícias médicas do INSS, aberturas de Comunicação de Acidente de Trabalho – CAT, de se relacionem a moléstia profissional.

Dessarte, para fins tributários, especialmente da isenção do Imposto de Renda Pessoa Física, a partir da aposentadoria, se já identificada a doença profissional anterior àquela, surge o direito a isenção do IRPF, independente do tipo de aposentadoria concedida.

Se no, entanto, a moléstia profissional só foi identificada e comprovada, após a aposentadoria, a partir da sua identificação e comprovação, surgirá o direito a isenção do imposto de renda pessoa física, sobre todos os valores decorrentes de proventos de aposentadoria.

Finalmente, ressalta-se que a isenção abrange todos os valores recebidos a título de proventos de aposentadoria, independente de qual seja a fonte pagadora, ou seja, se INSS, órgão público ou previdência privada complementar.


*Advogado especialista em isenções tributárias, titular do escritório Lino Advocacia e Consultoria Jurídica.
fones: (0xx17) 3342-0858 e (0xx17) 98111-4377



sexta-feira, 14 de março de 2014

DO ABUSO DO DIREITO DE AÇÃO


DO ABUSO DO DIREITO DE AÇÃO

Todos sabem que o Direito a ação é Constitucionalmente assegurado, e é um dos princípios basilares de nosso Estado democrático de Direito, no entanto, o abuso deste direito tem causado grandes malefícios à sociedade.

Hodiernamente, a proteção dos trabalhadores, e seus direitos consagrados na Constituição Federal, têm sido utilizados como pano de fundo para uma verdadeira enxurrada processual, que nem sempre possuem base jurídica sólida, quanto mais fática.

Não estamos defendendo a exclusão do direito a ação, muito menos que se impeça o trabalhador recorrer à justiça para poder exigir os direitos trabalhistas, mas versamos sobre a malversação do direito de ação.

É recorrente ouvirmos que o Judiciário é lento, que os processos não “andam”, que tudo é muito complicado e burocrático, o que não deixa de ser uma verdade, contudo, há que se analisar os principais motivos desta lentidão judiciária.

Muitos pregam que a lentidão é pela falta de estrutura, funcionários, ou até boa vontade dos que estão lá, no entanto, não veem que ano a ano, se entope o Poder Judiciário com ações muitas vezes infundadas, causando dano a toda sociedade.

Seguro que existem ações muito bem fundadas, direitos a serem defendidos, no entanto, temos observado no labor advocatício, que hoje estamos vivendo a “indústria da ação”, especialmente trabalhista.

A justiça do trabalho, protecionista por princípios e de muito fácil acesso ao reclamante que, diga-se de passagem, não tem custas (taxas) processuais a pagar durante todo o processo, sendo todo ônus suportado pelo reclamado (réu/empresa), é considerada a grande vilã, pelos comerciantes do Brasil afora, contudo, não é responsabilidade tão somente da justiça, mas todos que lá litigam por migalhas, fagulhas de direito, que poderiam ser resolvidos sem a via judicial.

Vemos um sem número processos que ingressam por diferenças de menos de 01 (um) salário mínimo, muitas vezes, ocorridos por erro de contabilidade e não por má-fé, só que, no entanto, não limitam ao pedido de “seu direito”, trazem uma carga imensamente de direitos que não lhe só devidos.

Rotineiramente observamos nas ações trabalhistas que o pedido de indenização por dano moral, virou “carne de vaca”, se encontra em todos os processos, desde os mais fundamentados em termos de fatos, até aos mais “simples”, todavia, na maioria dos casos, não houve o dano moral propriamente dito, o abalo psicológico tal que cause um dano ao empregado.

Comum, termos pedidos de indenização por dano moral, decorrente de descumprimento de obrigações trabalhistas, com respeito a quem entende diferente, o simples descumprimento de algumas obrigações trabalhistas, por si só não gera dano moral, vejamos o exemplo da falta de pagamento do FGTS pelo patrão, sendo que no final do contrato o empregado, fica tolhido de receber o valor que lhe é devido pela falta de depósito, isto caracteriza um dano material, não moral, não há a intenção do empregador em gerar dor psíquica ao empregado.

Na atual moda se encontra o dano moral coletivo, ou conhecido pela expressão “dumping social”, que seria motivado pela suposta ausência de cumprimento de deveres trabalhistas pelo empregador, porém, sem demonstrar claramente o repúdio, consciente e voluntário, do reclamado as leis e as normas coletivas, com intenção de trazer prejuízo aos trabalhadores de modo geral; demonstrar ainda deve que ocorreu o “dumping social” na esfera trabalhista, ao se comparar com outros países, visto que, não é uma norma exclusivamente interna.

Afirmamos que a culpa é da justiça do trabalho também, pois por ser extreme em proteção, joga todo o ônus da prova (responsabilidade pela prova) para o empregador, que mesmo, contendo todo um arcabouço de documentos, são estes ignorados, em prol da busca da verdade real, valendo muito mais a prova testemunhal, que é a “prostituta das provas”.

A avalanche processual, que toma conta de nossos tribunais, em especial trabalhista, é sentido diretamente pelos comerciantes, micro e pequenos empresários, que são a válvula propulsora de nossa economia. É sentida no bolso, visto que, precisam arcar com despesas advocatícias para se defenderem, além de terem a nítida noção que o advogado que foi contratado, irá agir como médico com o doente terminal, dar um paliativo, uma melhora, uma redução, uma vez que, a condenação é praticamente certa.

O sentimento de excesso de demandas judicial é geral, inclusive em nossa cidade, em qual, segundo estatística oficial do Tribunal Regional do Trabalho da 15.ª Região (http://portal.trt15.jus.br/documents/10157/0/Movimento+Processual+Conh+e+Execu%C3%A7%C3%A3o_internet_AGOSTO.pdf/43664673-6ec2-49cf-97f4-252f03bdce6a ) no mês de Agosto 2013, último mês que se dispôs na estatística, tínhamos na Vara do Trabalho de Bebedouro, um total de 7.604 (SETE MIL SEISCENTOS E QUATRO) processos em tramitação.

No período entre Janeiro a Agosto de 2013, de acordo a mesma estatística do Tribunal do Trabalho, em Bebedouro, tivemos 1.222 (mil duzentas e vinte e duas) novas ações iniciadas, uma média de 152,75 (cento e setenta e dois vírgula setenta e cinco) processos novos por mês.

Estes números representam o que os comerciantes de Bebedouro, já sabem na prática do dia a dia, Bebedouro, é mais uma vítima da enxurrada processual trabalhista.

Mas como reduzir? Extirpar o direito de ação? Eliminar os direitos trabalhistas? Não, de maneira nenhuma. Reduzir os números e as perdas é possível com diálogo, consenso, bom senso de ambas as partes e muita boa vontade de transigir, além disto, um setor de conciliação independente livre de pressões sindicais seria uma ótima solução, mas como, não é juridicamente permitido, ao menos que os que existem tivessem autonomia, e menos influência externa.

Quem viver verá! Ou reduzem as ações trabalhistas, ou ninguém irá aguentar, seja empregador pelo excesso de reclamações trabalhistas ou empregado pela demora secular de um processo.

 

 

Leandro Jorge de Oliveira Lino, OAB/SP n.º 218.168, blog: http://linoadvogados.blogspot.com.br, e-mail: leandro@linoadvocacia.com.br

 

 

 

 

 

 

 

terça-feira, 11 de março de 2014

ISENÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA AO MILITAR REFORMADO OU DA RESERVA REMUNERADA

ISENÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA AO MILITAR REFORMADO OU DA RESERVA REMUNERADA


*LEANDRO JORGE DE OLIVEIRA LINO

I – DA RESERVA REMUNERADA E REFORMA

Inicialmente temos que firmar o conceito que Reserva Remunerada ou Reforma são sinônimos de inatividade do militar, correspondente a aposentadoria do civil, portanto, a eles se estendem as isenções tributárias do imposto de renda previstas na Lei n.º 7.713/1988, quando versa de moléstia grave, moléstia profissional ou aposentadoria/reforma por acidente de trabalho.

Prevê o artigo 3.º, §1.º, b, II e III, da Lei n.º 6.880/1980 (Estatuto dos Militares), as hipóteses de inatividade dos militares, sendo elas, a reserva remunerada e a reforma.

Com relação à reforma, esta será concedida a pedido do militar, ou de ofício, sendo que, nesta última situação, dentre outras possibilidades ocorre quando for julgado incapaz, definitivamente, para o serviço ativo das Forças Armadas, nos termos do artigo 106, “caput”, inciso II, da Lei n.º 6.880/1980.

Estabelece ainda a Lei n.º 6.880/1980, as situações em quais são consideradas ocorrida a incapacidade definitiva do militar, sendo, portanto, reformado:

“Art. 108. A incapacidade definitiva pode sobrevir em conseqüência de:

        I - ferimento recebido em campanha ou na manutenção da ordem pública;

        II - enfermidade contraída em campanha ou na manutenção da ordem pública, ou enfermidade cuja causa eficiente decorra de uma dessas situações;

        III - acidente em serviço;

        IV - doença, moléstia ou enfermidade adquirida em tempo de paz, com relação de causa e efeito a condições inerentes ao serviço;

        V - tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, lepra, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, mal de Parkinson, pênfigo, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave e outras moléstias que a lei indicar com base nas conclusões da medicina especializada; e (Redação dada pela Lei nº 12.670, de 2012)

        VI - acidente ou doença, moléstia ou enfermidade, sem relação de causa e efeito com o serviço.”

II – DA ISENÇÃO DO IRPF

Ao se analisar as hipóteses previstas no artigo 108, da Lei n.º 6.880/1980, observa-se que algumas delas enquadram nas que se concedem isenção do imposto de renda pessoa física.

A Lei n.º 7.713/1988, em seu artigo 6.º, “caput”, inciso XIV, com a redação dada pela Lei n.º 11.052/2004, estabelece as condições para isenção do IRPF ao inativo:

“XIV – os proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, hepatopatia grave, estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome da imunodeficiência adquirida, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma; (Redação dada pela Lei nº 11.052, de 2004)”


A primeira vista, a isenção do IRPF ao inativo militar só seria possível se fosse ele reformado por motivo de acidente em serviço, no entanto, este entendimento é o mais singelo possível, sendo que, como já exposto anteriormente, o inativo militar pode estar vinculado a Reserva Remunerada ou a Reforma, e neste caso não obrigatoriamente decorrente de acidente de serviço.

Como a legislação do Imposto de Renda, trouxe o termo genérico “proventos de aposentadoria” e logo em seguida versou sobre a reforma por acidente, a melhor interpretação é aquela a qual se considera abrangido no termo “proventos de aposentadoria” os vencimentos do INATIVO MILITAR decorrente de Reforma Remunerada.

Entendimento contrário feriria frontalmente os princípios da isonomia tributária e dignidade da pessoa humana, pois os inativos militares devem ser tratados igualmente aos inativos militares pela lei tributária, que se fizer uma discriminação imotivada, estará ferindo o princípio constitucional da isonomia tributária.

Neste sentido é a Jurisprudência do Conselho Administrativo de Recursos da Fazenda–CARF da Receita Federal:

“Imposto sobre a Renda de Pessoa Física - IRPF Ano-calendário: 2008 ISENÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA. MOLÉSTIA GRAVE. MILITAR REFORMADO. Os proventos de aposentadoria, reforma ou reserva remunerada, motivadas por acidente em serviço e os percebidos por portador de moléstia profissional ou grave, ainda que contraída após a aposentadoria, reforma ou reserva remunerada, são isentos do imposto de renda. (Súmula CARF 43). Recurso Provido”

(Autos n.º 18239.004475/2009-93, sessão 16/10/2013, Relator: Cons. German Alejandro San Martín Fernández)

“Súmula 43 CARF:
Os proventos de aposentadoria, reforma ou reserva remunerada, motivadas por acidente em serviço e os percebidos por portador de moléstia profissional ou grave, ainda que contraída após a aposentadoria, reforma ou reserva remunerada, são isentos do imposto de renda.”

De outro canto, temos considerar as outras situações que levam o militar a inatividade decorrente de reforma.

Como já salientado a reforma não decorre obrigatoriamente da incapacidade para atuação militar ou de acidente de serviço, pois, v.g., existe a realizada a pedido do militar, desde que atendidos certos requisitos legais, ou ainda que seja por incapacidade existem situações que não são exatamente acidente em serviço, mas que dão o direito à isenção do IRPF.

II.1- DA ISENÇÃO DECORRENTE DE MOLÉSTIA GRAVE

Ao inativo Militar seja ele da reserva ou da reforma, se portador de uma das moléstias consideradas como graves pela legislação do Imposto de Renda, possui o direito a isenção do IR sobre os proventos da inatividade, pagos nos termos do artigo 3.º, da Lei n.º 1.316/1951, mesmo quando a moléstia seja contraída após a reserva ou reforma.

São as moléstias isentivas consideradas na lei:



·         tuberculose ativa,
·          alienação mental,
·         esclerose múltipla,
·          neoplasia maligna,
·          cegueira,
·         hanseníase,
·         paralisia irreversível e incapacitante,
·         cardiopatia grave,
·         doença de Parkinson,
·         espondiloartrose anquilosante,
·         nefropatia grave,
·         hepatopatia grave,
·         estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante),
·         contaminação por radiação,
·         síndrome da imunodeficiência adquirida



Uma vez na inatividade o militar e portador de uma das doenças supra descritas, e comprovada vai laudo médico pericial do serviço público de saúde, possui o direito a isenção do IRPF sobre os proventos de inatividade, e eventual restituição dos valores pagos na fonte e na declaração de ajuste anual do imposto de renda.

Igualmente este direito se estende as pensionistas dos militares, que possuam uma das moléstias graves relacionadas.

II.2 – DA MOLÉSTIA PROFISSIONAL

A Lei n.º 8.213/1991, em seu artigo 20, que trata dos benefícios da previdência social, nos traz o conceito jurídico de moléstia profissional, como sendo: assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social.

A relação atividade laboral e moléstia profissional, se encontra descrito no §§ 1º a 4º, somando-se a estes o Artigo 337 e Anexo II, lista B e C, ambos do Decreto n.º 3048/1999, com a redação dada pelo Decreto n.º 6.042/2007.

No entanto, tal lista é válida exclusiva para a previdência do Regime Geral de Previdência, sendo que no regime próprio, especialmente militar, existe regulamento próprio.

De acordo com a Lei n.º 6.880/1980, concede-se a reforma ao militar que fique incapacitado para a atividade militar decorrente de:

“II - enfermidade contraída em campanha ou na manutenção da ordem pública, ou enfermidade cuja causa eficiente decorra de uma dessas situações;”
(...)
“ IV - doença, moléstia ou enfermidade adquirida em tempo de paz, com relação de causa e efeito a condições inerentes ao serviço;”

Conjugando o entendimento que doença profissional é produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade, e levando-se em consideração a previsão legal, que ela é uma das causas da reforma, conclui-se que o militar é isento do IRPF, decorrente de moléstia profissional, nas seguintes hipóteses: i - contrair enfermidade em campanha, na manutenção da ordem pública, ou decorrente de uma dessas situações; ii – doença, moléstias ou enfermidade adquirida em tempo de paz, mas decorrente das condições do serviço.

III.3 – DA REFORMA POR ACIDENTE EM SERVIÇO

O acidente em serviço relativo ao Militar se equipara ao acidente de trabalho no âmbito civil, sendo que existem alguns nuances, previstos na legislação militar.

O Decreto n.º 57.272/1965 define o que é considerado acidente em serviço no âmbito militar das forças armadas.

De acordo com o Decreto n.º 57.272/1965, artigo 1.º, acidente em serviço é aquele que ocorra com militar da ativa, quando:

        a) no exercício dos deveres previstos no Art. 25 do Decreto-Lei nº 9.698, de 2 de setembro de 1946 (Estatuto dos Militares); (Atualmente art. 31, da Lei n.º 6.880/1980)

        b) no exercício de suas atribuições funcionais, durante o expediente normal, ou, quando determinado por autoridade competente, em sua prorrogação ou antecipação;

        c) no cumprimento de ordem emanada de autoridade militar competente;

        d) no decurso de viagens em objeto de serviço, previstas em regulamentos ou autorizados por autoridade militar competente;


        e) no decurso de viagens impostas por motivo de movimentação efetuada no interesse do serviço ou a pedido;

        f) no deslocamento entre a sua residência e a organização em que serve ou o local de trabalho, ou naquele em que sua missão deva ter início ou prosseguimento, e vice-versa.  (Redação dada pelo Decreto nº 64.517, de 15.5.1969)

Considera-se ainda ao acidente em serviço, ainda quando não seja ele a causa única e exclusiva da morte ou da perda ou redução da capacidade do militar, desde que entre o acidente e a morte ou incapacidade haja relação de causa e efeito.

Diante do conceito legal de acidente de serviço, devemos analisar as situações em quais levam a reforma do militar decorrente de incapacidade, que podem ser consideradas acidente em serviço.


Nos termos do artigo 108, da Lei n.º 6.880/1980, algumas situações específicas, que iremos abordar, dão o direito a reforma por incapacidade definitiva, que ao nosso entender, se amoldam perfeitamente no conceito de acidente em serviço e, portanto, geraria o direito a isenção do imposto de renda pessoa física.

O art. 108 reporta-se a duas situações interessantes para este tópico: i- o acidente em serviço próprio; e ii – o acidente em serviço impróprio.

O acidente em serviço próprio é o descrito na sua alínea III, cite-se:
“Art. 108. A incapacidade definitiva pode sobrevir em conseqüência de:
(...)
III - acidente em serviço;”

Neste caso, é reconhecido sem qualquer discussão o direito a isenção do Imposto de renda, ao militar reformado decorrente de acidente em serviço.

No entanto, temos o acidente em serviço impróprio, o qual se amolda em uma das hipóteses do artigo 1.º, do Decreto n.º 57.272/1965, narrado na alínea I, do artigo 108, da Lei nº 6.880/1965:

“Art. 108. A incapacidade definitiva pode sobrevir em conseqüência de:
 I - ferimento recebido em campanha ou na manutenção da ordem pública;”

O ferimento em campanha ou manutenção da ordem pública pode ser considerado um acidente em serviço, digamos impróprio, pois apesar de estar previsto expressamente no rol do Decreto n.º 57.272/1965, nele pode ser enquadrados, em duas situações.

Veja-se, o Decreto n.º 57.272/1965, diz que é considerado acidente em serviço o ocorrido no exercício dos deveres previstos no Art. 25 do Decreto-Lei nº 9.698, de 2 de setembro de 1946.

O Decreto-Lei n.º 9.698/1946 encontra-se revogado, sendo que atualmente os deveres dos militares estão regidos pela Lei n.º 6.880/1980, em seu artigo 31 e ss..

Segundo o artigo 31, da Lei n.º 6.880/1980, conceituam-se como deveres dos militares:

“Art. 31. Os deveres militares emanam de um conjunto de vínculos racionais, bem como morais, que ligam o militar à Pátria e ao seu serviço, e compreendem, essencialmente:

        I - a dedicação e a fidelidade à Pátria, cuja honra, integridade e instituições devem ser defendidas mesmo com o sacrifício da própria vida;

        II - o culto aos Símbolos Nacionais;

        III - a probidade e a lealdade em todas as circunstâncias;

        IV - a disciplina e o respeito à hierarquia;

        V - o rigoroso cumprimento das obrigações e das ordens; e

        VI - a obrigação de tratar o subordinado dignamente e com urbanidade.”

O ferimento em campanha ou manutenção da ordem pública pode ser considerado como ocorrido em cumprimento de um dos deveres do militar, qual seja, “a dedicação e a fidelidade à Pátria, cuja honra, integridade e instituições devem ser defendidas mesmo com o sacrifício da própria vida”.

A campanha de guerra ou manutenção da ordem pública é um ato de dedicação e fidelidade à pátria, inclusive com risco de sacrífico a própria vida e, portanto, é para os devidos fins de direito considerado acidente em serviço, desta forma, o militar que for reformado por incapacidade decorrente de ferimento recebido em campanha ou na manutenção da ordem pública, faz jus a isenção do IRPF.

Ainda que se considere que o ferimento em campanha ou na manutenção da ordem pública, não se amolde a situação relativa à dedicação e a fidelidade à pátria, sob risco da própria vida, pode ser considerado acidente em serviço, visto que, ocorreu “no exercício de suas atribuições funcionais, durante o expediente normal, ou, quando determinado por autoridade competente, em sua prorrogação ou antecipação” ou no “cumprimento de ordem emanada de autoridade militar competente”.

III – DO CONCLUSÃO

De todo o exposto conclui-se que a isenção do imposto de renda pessoa física, decorrente de moléstia grave, moléstia profissional, se aplica aos militares da reserva remunerada, assim como, aos reformados por incapacidade, decorrente de motivos diversos do acidente em serviço.

Por sua vez, a isenção pela reforma decorrente de acidente de serviço, deve ser analisada sob o prisma da conjugação da Lei n.º 6.880/1980 e Decreto n.º 57.272/1965, para consagrar o direito à isenção, nas hipóteses de reforma por acidente próprio e acidente impróprio, assim entendido, o relativo ao “exercício de suas atribuições funcionais, durante o expediente normal, ou, quando determinado por autoridade competente, em sua prorrogação ou antecipação” ou no “cumprimento de ordem emanada de autoridade militar competente”.







* Advogado Tributarista, especialista em isenções tributárias, proprietário do escritório Lino Advogados.
Contatos: 17-3342-0858- 3044-2256- - 98111-4377




quarta-feira, 5 de março de 2014

ISENÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA SOBRE O GANHO DE CAPITAL - QUITAÇÃO FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO

ISENÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA SOBRE O GANHO DE CAPITAL - QUITAÇÃO FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO

*LEANDRO JORGE DE OLIVEIRA LINO

I – DA DELIMITAÇÃO DO TEMA

Inicialmente temos que conceituar o que vem a ser Ganho de Capital, ou lucro imobiliário: é considerado como a diferença positiva entre o valor de alienação do bem e o seu respectivo custo de aquisição, abatido à depreciação prevista em Lei.

Exemplo: Se há a venda de um imóvel por R$ 100.000,00, sendo que seu custo de aquisição foi de R$ 50.000,00, temos um “lucro imobiliário” de R$ 50.000,00, que poderá ou não ser tributado, a depender do enquadramento nas hipóteses legais de isenção.

A legislação tributária brasileira versa claramente sobre o ganho de capital no artigo 3.º, §3.º, da Lei n.º 7.713/1988, e no Decreto n.º 3.000/1999, em seu artigo 117, §4.º, assim definindo-o:

“§ 3º Na apuração do ganho de capital serão consideradas as operações que importem alienação, a qualquer título, de bens ou direitos ou cessão ou promessa de cessão de direitos à sua aquisição, tais como as realizadas por compra e venda, permuta, adjudicação, desapropriação, dação em pagamento, doação, procuração em causa própria, promessa de compra e venda, cessão de direitos ou promessa de cessão de direitos e contratos afins.”

Por sua vez, a alíquota de incidência do IRPF sobre o lucro imobiliário é de 15 % (quinze) por cento sobre o ganho de capital auferido, nos termos do artigo 21, “caput”, da Lei n. 8.981/1995.

No entanto, existem algumas hipóteses legais de isenção do imposto de renda sobre tal lucro imobiliário, dentre as hipóteses existentes, temos a hipótese da aplicação total do produto da venda de imóvel residencial, na aquisição de outro imóvel residencial localizado no País, desde que feito no prazo de 180 (cento e oitenta) dias da data da venda.

Tal previsão está no artigo 39, “caput”, da Lei n.º 11.196/2005:

“Art. 39. Fica isento do imposto de renda o ganho auferido por pessoa física residente no País na venda de imóveis residenciais, desde que o alienante, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias contado da celebração do contrato, aplique o produto da venda na aquisição de imóveis residenciais localizados no País.”

Ao ser analisar a Lei n.º 11.196/2005, verifica-se que nela não tem qualquer previsão que impeça a isenção do imposto de renda sobre o lucro imobiliário, quando o valor da venda seja totalmente empregado na quitação, total ou parcial, débito remanescente de aquisição a prazo ou à prestação de imóvel residencial já possuído pelo alienante.

No entanto, inovando no mundo jurídico veio a Instrução Normativa da Receita Federal n.º 599/2005, que regulamentou na Receita Federal a apuração e cobrança do IR sobre o lucro imobiliário.

A IN SRF 599/2005, em seu § 11, do artigo 2.º, trouxe previsão que impede a isenção do IR sobre o lucro imobiliário se o valor da venda foi utilizado para quitar outro imóvel anteriormente adquirido pelo alienante.

“Art. 2º  Fica isento do imposto de renda o ganho auferido por pessoa física residente no País na venda de imóveis residenciais, desde que o alienante, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias contado da celebração do contrato, aplique o produto da venda na aquisição, em seu nome, de imóveis residenciais localizados no País.
(...)
§ 11. O disposto neste artigo não se aplica, dentre outros:

I - à hipótese de venda de imóvel residencial com o objetivo de quitar, total ou parcialmente, débito remanescente de aquisição a prazo ou à prestação de imóvel residencial já possuído pelo alienante;”

Seguindo o entendimento da vedação da isenção IR sobre o ganho de capital decorrente da venda de imóvel para quitação de outro, que em tese já possuía, temos o entendimento claro da Receita Federal demonstrado nas “Perguntas e Respostas” do IRPF 2013, em seu item 604:

ÚNICO IMÓVEL — AQUISIÇÃO DE OUTRO POR CONTRATO PARTICULAR
604 — Proprietário de um imóvel adquire, mediante contrato particular, outro imóvel a ser construído. A alienação do imóvel que possui, antes do recebimento daquele em construção, se enquadra na isenção de alienação de único imóvel por valor igual ou inferior a R$ 440.000,00?
O proprietário de um imóvel que adquire outro imóvel, construído ou em construção, mediante contrato particular pactuado com a construtora ou agente financeiro, ainda que não tenha desembolsado qualquer quantia, tem, a partir do contrato, a propriedade de dois imóveis, não podendo, na venda de um deles, fazer jus à isenção do único imóvel alienado por valor igual ou inferior a R$ 440.000,00.
O contrato particular firmado entre a construtora/agente financeiro e o adquirente é instrumento válido para configurar a aquisição do imóvel.
(Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999 – Regulamento do Imposto sobre a Renda – RIR/1999, art. 39, inciso III; Instrução Normativa SRF nº 84, de 11 de outubro de 2001, art. 29, I)

Igualmente encontramos a previsão no DIMOB – Declaração de Informações Imobiliárias, que afirma que a propriedade é transferida da construtora para o adquirente, com a celebração do contrato, ainda que seja através de financiamento imobiliário.

“52. As "vendas efetuadas" se concretizam na data de assinatura do contrato de compra e venda com a construtora ou na data do registro de imóveis?
Na data de assinatura do contrato de compra e venda com a construtora.”

Pela análise do disposto supra verifica-se que a Receita Federal, entende que com a celebração de contrato de compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que seja na planta, e se utilizando de financiamento imobiliário, considera-se adquirida e transferida a propriedade e, portanto, não poderia ser considerado para fins de isenção do IR sobre o ganho de capital, pois já era anteriormente de propriedade do contribuinte.

Diante de tal situação muitos contribuintes têm sido autuados e sofrem lançamentos tributários feitos pela Receita Federal, cobrando o IR sobre o lucro imobiliário, alegando que o uso do valor da venda de imóvel residencial para quitar outro residencial, mas já anteriormente adquirido, não se encontra na hipótese de isenção do IR.

II – DO DIREITO A ISENÇÃO

De outro lado, temos a previsão expressa do § 10, do artigo 2.º, da IN SRF 599/2005, que garante a isenção do IR nas aquisições de  imóvel residencial em construção ou na planta.

Ҥ 10. O disposto neste artigo aplica-se, inclusive:
I - aos contratos de permuta de imóveis residenciais;
II - à venda ou aquisição de imóvel residencial em construção ou na planta.”

Desta forma, de início já temos uma franca contradição entre o permissivo do §10, com a vedação do §11, ambos do artigo 2.º, da IN SRF 599/2005.

Além disto, há que ser analisada a natureza jurídica do contrato de financiamento imobiliário, segundo a legislação pátria.

O contrato de compromisso de compra e venda, não é título aquisitivo hábil para a transferência automática da propriedade, que se só será realizada ao final da construção, com a lavratura da escritura pública e levada ao registro no cartório de imóveis.


Não pode confundir direitos reais de garantia com a propriedade, pois existindo apenas o contrato de compromisso de compra e venda, existem os direitos reais sobre o imóvel em construção, mas não a propriedade. Tal previsão está no §2.º, do artigo 32, da Lei 4.591/1964, com a redação dada pela Lei n.º 10.931/2004:

§ 2o Os contratos de compra e venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão de unidades autônomas são irretratáveis e, uma vez registrados, conferem direito real oponível a terceiros, atribuindo direito a adjudicação compulsória perante o incorporador ou a quem o suceder, inclusive na hipótese de insolvência posterior ao término da obra. (Redação dada pela Lei nº 10.931, de 2004)”

Temos ainda que considerar a previsão do artigo 1.417, do Código Civil Brasileiro, que diz textualmente que o contrato de compromisso de compra e venda, o promitente-comprador adquire o direito a adquirir o imóvel, e não o adquire automaticamente com o contrato.

“Art. 1.417. Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel.”

Considere-se ainda que a propriedade definitiva do imóvel edificado só é transferida via escritura pública e averbado no cartório de registro de imóveis, como dispõe os artigos 1.227 e 1.245 do Código Civil Brasileiro.

“Art. 1.227. Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste Código.”

“Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.
§ 1o Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel.
(...)”

Portanto, conclui-se que a promessa de compra e venda ou mesmo o contrato de compra e venda decorrente de incorporação de imobiliária, antes da lavratura da escritura pública definitiva e registrada no cartório de imóveis, não existe a propriedade do contratante, apenas direitos reais sobre o imóvel diferente da propriedade definitiva.

Cumpre salientar que, ao conceder o benefício para imóveis adquiridos na planta, a norma está a garantir que o ganho de capital seja utilizado para pagamento de parcelas do imóvel, ou de sua integralidade, antes da transferência de propriedade. Isto porque, conforme prevê a Lei que disciplina as Incorporações Imobiliárias (Lei n.º 4.591/64), no caso de aquisição de imóveis na planta, o registro de propriedade só pode ser efetuado após o término da construção, quando se viabiliza a emissão do “habite-se”.

Nos termos do artigo 44, da Lei n° 4.591/64, que dispõe sobre as incorporações imobiliárias, até o momento da averbação da construção no registro imobiliário, após a conclusão da obra e emissão do habite-se, os adquirentes das unidades não possuem a propriedade do imóvel, mas apenas de cada fração ideal do terreno, recaindo todas as obrigações sobre o incorporador.

Analisar ainda se faz necessário, a questão da legalidade da IN SRF n.º 599/2005, ao extrapolar a simples regulamentação da Lei, e a interpretação da isenção.

A instrução normativa é um ato normativo administrativo da Fazenda Pública, que visa esclarecer os termos da Lei, trazer um regulamento interno, não podendo criar tributos, majorá-los, criar isenções ou mesmo negá-las, visto que tais situações é exclusividade da Lei, nos termos do artigo 150, I, e §6.º da CF/88.


Uma vez que a IN SRF n.º 599/2005, extrapolou a simples regulamentação, ao criar uma vedação à isenção não prevista na lei, feriu precipuamente o princípio da legalidade tributária, portanto, é ilegal, para não se dizer inconstitucional, dessarte, não deve ser considerada para os devidos fins legais.

Por derradeiro, saliente-se que nos termos do artigo 111, II, do CTN, a lei tributária que disponha sobre isenção deve ser interpretada literalmente e, como não há previsão literal da exclusão da isenção do IR sobre o ganho de capital cujo valor tenha sido totalmente empregado na quitação de financiamento imobiliário, a previsão na IN SRF n.º 599/2005, mais uma vez não deve prosperar.

Neste sentido temos a jurisprudência do TRF4:

EMENTA: TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. GANHO DE CAPITAL NA ALIENAÇÃO DE BEM IMÓVEL RESIDENCIAL. IN/SRF Nº 599/2005 E ART. 39 DA LEI Nº 11.196/05. O Código Tributário Nacional - CTN, em seu art. 111, II, prevê que "Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre (...) II - outorga de isenção". A Lei nº 11.196/05, ao dispor acerca da isenção do IRPF sobre o ganho na alienação de imóvel residencial, apenas exigiu que, no prazo de 180 dias da venda, seja aplicado "o produto da venda na aquisição de imóveis residenciais localizados no País". Ou seja, a lei estabeleceu como requisito da isenção do IRPF não propriamente a aquisição de novo imóvel no prazo de 180 dias da venda, mas a aplicação/utilização, neste período, do recurso obtido com a venda de imóvel na compra de novo imóvel. Nada mais. Considerar que o requisito da isenção prevista na Lei nº 11.196/05 é a aquisição, em si, de novo imóvel, e não a aplicação (na aquisição de novo imóvel) do recurso obtido com a venda de imóvel, leva a uma interpretação equivocada do dispositivo legal, no sentido de restringir o gozo do benefício fiscal instituído em lei, exatamente como o fez a Receita Federal, através da IN/SRF nº 599/2005. Com efeito, o art. 39 da Lei nº 11.196/05 não autoriza as restrições criadas pela IN/SRF nº 599/2005, notadamente aquelas previstas nos parágrafos 6º, 7º e 11 do art. 2º dessa norma infralegal. (TRF4, APELREEX 5013981-39.2013.404.7200, Segunda Turma, Relatora p/ Acórdão Luciane Amaral Corrêa Münch, D.E. 13/02/2014)

EMENTA: TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. GANHO DE CAPITAL NA ALIENAÇÃO DE BEM IMÓVEL RESIDENCIAL. IN/SRF Nº 599/2005 E ART. 39 DA LEI Nº 11.196/05. O Código Tributário Nacional - CTN, em seu art. 111, II, prevê que "Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre (...) II - outorga de isenção". A Lei nº 11.196/05, ao dispor acerca da isenção do IRPF sobre o ganho na alienação de imóvel residencial, apenas exigiu que, no prazo de 180 dias da venda, seja aplicado "o produto da venda na aquisição de imóveis residenciais localizados no País". Ou seja, a lei estabeleceu como requisito da isenção do IRPF não propriamente a aquisição de novo imóvel no prazo de 180 dias da venda, mas a aplicação/utilização, neste período, do recurso obtido com a venda de imóvel na compra de novo imóvel. Nada mais. Considerar que o requisito da isenção prevista na Lei nº 11.196/05 é a aquisição, em si, de novo imóvel, e não a aplicação (na aquisição de novo imóvel) do recurso obtido com a venda de imóvel, leva a uma interpretação equivocada do dispositivo legal, no sentido de restringir o gozo do benefício fiscal instituído em lei, exatamente como o fez a Receita Federal, através da IN/SRF nº 599/2005. Com efeito, o art. 39 da Lei nº 11.196/05 não autoriza as restrições criadas pela IN/SRF nº 599/2005, notadamente aquelas previstas nos parágrafos 6º, 7º e 11 do art. 2º dessa norma infralegal. (TRF4, AC 5004112-95.2012.404.7100, Segunda Turma, Relatora Luciane Amaral Corrêa Münch, D.E. 18/12/2013)

EMENTA: TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. GANHO DE CAPITAL NA ALIENAÇÃO DE BEM IMÓVEL RESIDENCIAL. IN/SRF Nº 599/2005 E ART. 39 DA LEI Nº 11.196/05. O Código Tributário Nacional - CTN, em seu art. 111, II, prevê que "Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre (...) II - outorga de isenção". A Lei nº 11.196/05, ao dispor acerca da isenção do IRPF sobre o ganho na alienação de imóvel residencial, apenas exigiu que, no prazo de 180 dias da venda, seja aplicado "o produto da venda na aquisição de imóveis residenciais localizados no País". Ou seja, a lei estabeleceu como requisito da isenção do IRPF não propriamente a aquisição de novo imóvel no prazo de 180 dias da venda, mas a aplicação/utilização, neste período, do recurso obtido com a venda de imóvel na compra de novo imóvel. Nada mais. Considerar que o requisito da isenção prevista na Lei nº 11.196/05 é a aquisição, em si, de novo imóvel, e não a aplicação (na aquisição de novo imóvel) do recurso obtido com a venda de imóvel, leva a uma interpretação equivocada do dispositivo legal, no sentido de restringir o gozo do benefício fiscal instituído em lei, exatamente como o fez a Receita Federal, através da IN/SRF nº 599/2005. Com efeito, o art. 39 da Lei nº 11.196/05 não autoriza as restrições criadas pela IN/SRF nº 599/2005, notadamente aquelas previstas nos parágrafos 6º, 7º e 11 do art. 2º dessa norma infralegal. (TRF4, AC 5004038-95.2013.404.7200, Segunda Turma, Relator Rômulo Pizzolatti, D.E. 18/12/2013)

III - CONCLUSÃO

A guisa de conclusão, podemos afirmar que a negativa de isenção do imposto de renda decorrente do ganho de capital, cujo valor integral da venda tenha sido empregado na quitação de outro imóvel objeto de contrato de compromisso de compra e venda, inclusive na planta, prevista na IN SRF n.º 599/2005, é ilegal e inconstitucional, não possuindo valor jurídico.

Mas ante ao entendimento da Receita Federal, contrário à isenção, faz-se necessário à busca por ela via mandado de segurança preventivo, ou repressivo ou ainda ação anulatória de débito fiscal.




* Advogado Tributarista, pós-graduado em Direito Material e Processual Tributário, e especialista em isenções tributárias. e-mail: leandro@linoadvocacia.com.br, blog: http://linoadvogados.blogspot.com.br.